Salmo 109
1.Salmo de Davi. Eis o oráculo do Senhor que se dirige a meu senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu faça de teus inimigos o escabelo de teus pés.
2.O Senhor estenderá desde Sião teu cetro poderoso: Dominarás, disse ele, até no meio de teus inimigos.
3.No dia de teu nascimento, já possuis a realeza no esplendor da santidade; semelhante ao orvalho, eu te gerei antes da aurora.
4.O Senhor jurou e não se arrependerá: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec.
5.O Senhor está à tua direita: ele destruirá os reis no dia de sua cólera.
6.Julgará os povos pagãos, empilhará cadáveres; por toda a terra esmagará cabeças.
7.Beberá da torrente no caminho; por isso, erguerá a sua fronte.
O Messias, rei e sacerdote
1. Escutamos um dos Salmos mais célebres da história da cristandade. O Salmo 109, que a Liturgia das Vésperas nos propõe todos os domingos é citado, de facto, várias vezes pelo Novo Testamento. Sobretudo os versículos 1 e 4 são aplicados a Cristo, no seguimento da antiga tradição judaica, que tinha transformado este hino de cântico real davídico em Salmo messiânico.
Deve-se a popularidade desta oração também ao uso constante que dela fazem as Vésperas do domingo. Por este motivo o Salmo 109, na versão latina da Vulgata, foi objecto de numerosas e maravilhosas composições musicais que assinalaram a história da cultura ocidental. A Liturgia, segundo a praxe escolhida pelo Concílio Vaticano II, retirou do texto original hebraico do Salmo, que entre outras coisas é formado apenas por 63 palavras, o violento versículo 6. Ele evoca a tonalidade dos chamados "Salmos imprecatórios" e descreve o rei hebraico no momento em que avança para uma espécie de campanha militar, esmagando os seus adversários e julgando as nações.
2. Visto que teremos ocasião de voltar a falar acerca deste Salmo, considerando o uso que dele faz a Liturgia, limitemo-nos agora a oferecer apenas uma visão de conjunto do mesmo.
Nele podemos distinguir claramente duas partes. A primeira (cf. vv. 1-3) contém um oráculo dirigido por Deus àquele que o Salmista chama "o meu senhor", ou seja, ao soberano de Jerusalém. O oráculo proclama a entronização do descendente de David "à direita" de Deus. Com efeito, o Senhor dirige-se a ele dizendo: "Senta-te à minha direita" (v. 1). Provavelmente, temos aqui a menção de um ritual, segundo o qual o eleito se sentava à direita da arca da aliança, de modo que pudesse receber o poder de governo do rei supremo de Israel, isto é, do Senhor.
3. No fundo intuem-se forças hostis, que contudo são neutralizadas por uma conquista vitoriosa: os inimigos são representados aos pés do soberano, que avança solene no meio deles segurando o ceptro da sua autoridade (cf. vv. 1-2). É sem dúvida o reflexo de uma situação política concreta, que se verificava nos momentos de passagem do poder de um rei para outro, com a rebelião de alguns subalternos ou com tentativas de conquista. Mas agora o texto remete para um contraste de índole geral entre o projecto de Deus, que age através do seu eleito, e os desígnios daqueles que gostariam de afirmar o seu poder hostil e prevaricador. Tem-se, por conseguinte, o eterno confronto entre o bem e o mal, que se verifica no âmbito de vicissitudes históricas, mediante as quais Deus se manifesta e nos fala.
4. A segunda parte do Salmo contém, ao contrário, um oráculo sacerdotal, que tem ainda como protagonista o rei davídico (cf. vv. 4-7). Garantida por um solene juramento divino, a dignidade real une em si também a sacerdotal. A referência a Melquisedec, rei-sacerdote de Salém, ou seja, da antiga Jerusalém (cf. Gn 14), talvez seja o meio para justificar o sacerdócio particular do rei ao lado do sacerdócio oficial levítico do templo de Sião. Depois, sabemos também que a Carta aos Hebreus partirá precisamente deste oráculo: "Tu és sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedec" (Sl 109, 4), para ilustrar o sacerdócio único e perfeito de Jesus Cristo. Examinaremos sucessivamente de maneira mais profunda o Salmo 109, fazendo uma análise atenta de cada um dos versículos.
5. Mas para concluir, gostaríamos de ler o versículo inicial do Salmo com o oráculo divino: "Senta-te à minha direita, enquanto ponho os teus inimigos por escabelo dos teus pés". E fá-lo-emos com São Máximo de Turim (quarto-quinto século), que, no seu Sermão sobre o Pentecostes, o comenta do seguinte modo: "Segundo os nossos costumes a compartilha do trono é oferecida àquele que, tendo realizado qualquer empreendimento, ao chegar vencedor merece sentar-se em sinal de honra. Por conseguinte, também o homem Jesus Cristo, ao vencer com a sua paixão o diabo, abrindo com a sua ressurreição os reinos do abismo e chegando vitorioso ao céu, como que depois de ter cumprido uma tarefa, ouve de Deus Pai este convite: "Senta-te à minha direita". Não nos devemos admirar se o Pai oferece ao Filho, que é consubstancial ao Pai, a partilha do trono... O Filho senta à direita porque, segundo o Evangelho, à direita estarão as ovelhas e à esquerda os cordeiros. Por conseguinte, é necessário que o primeiro Cordeiro ocupe a parte das ovelhas e o Chefe imaculado ocupe antecipadamente o lugar destinado ao rebanho imaculado que o seguirá" (40, 2: Scriptores circa Ambrosium, IV, Milão-Roma 1991, pág. 195).
PAPA JOÃO PAULO II
AUDIÊNCIA GERAL
Quarta-Feira, 26 de Novembro de 2003
Diretório Franciscano - Salmo 109 (Espanhol)
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