quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Comentário ao Salmo 10


Salmo 10
Confiança do justo
1.Ao mestre de canto. De Davi. É junto do Senhor que procuro refúgio. Por que dizer-me: Foge, velozmente, para a montanha, como um pássaro;
2.eis que os maus entesam seu arco, ajustam a flecha na corda, para ferir, de noite, os que têm o coração reto.
3.Quando os próprios fundamentos se abalam, que pode fazer ainda o justo?
4.Entretanto, o Senhor habita em seu templo, o Senhor tem seu trono no céu. Sua vista está atenta, seus olhares observam os filhos dos homens.
5.O Senhor sonda o justo como o ímpio, mas aquele que ama a injustiça, ele o aborrece.
6.Sobre os ímpios ele fará cair uma chuva de fogo e de enxofre; um vento abrasador de procela será o seu quinhão.
7.Porque o Senhor é justo, ele ama a justiça; e os homens retos contemplarão a sua face.

O justo tem confiança no Senhor
1. Continua  a  nossa  reflexão  sobre os  textos  dos  Salmos,  que  constituem o  elemento  substancial  da  Liturgia das  Vésperas.  O  que  agora  fizemos ressoar  nos  nossos  corações  foi  o Salmo 10, uma breve oração de confiança que, no original hebraico, está marcada pelo sagrado nome divino, 'Adonaj, o Senhor. Este nome ressoa na abertura (cf. v. 1), encontra-se três vezes no centro do Salmo (cf. vv. 4-5) e volta no fim (cf. v. 17).
A tonalidade espiritual de todo o cântico é muito bem expressa pelo versículo conclusivo:  "O Senhor é justo e ama a justiça". É esta a raiz de qualquer confiança e a fonte de toda a esperança no dia da obscuridade e da prova. Deus não permanece indiferente em relação ao bem e ao mal, é um Deus bom e não um acontecimento obscuro, indecifrável e misterioso.
2. O Salmo desenvolve-se substancialmente em dois cenários. No primeiro (cf. vv. 1-3) está descrito o ímpio no seu triunfo aparente. Ele é caracterizado por imagens de tipos bélico e venial:  é o pervertido, que retesa o arco da guerra ou da caça para disparar com violência contra as suas vítimas, isto é, os de coração recto (cf. v. 2). Por isso, eles são tentados pela ideia de evadir e de se libertar de uma presa tão implacável. Gostaria de fugir "para o monte como as aves" (v. 1), longe do vórtice do mal, do assédio dos malvados, das setas das calúnias lançadas à traição pelos pecadores.
Há  uma  espécie  de  desconforto  no fiel  que  se  sente  só  e  impossibilitado face  à  irrupção  do  mal.  Parece  que os  fundamentos  da  justa  ordem  social são  abalados  e  as  próprias  bases  da convivência humana estão ameaçadas. (cf. v. 3).
3. Eis então a mudança, traçada no segundo cenário (cf. vv. 4-7). O Senhor, sentado no seu trono celeste, abrange com o seu olhar penetrante todo o horizonte humano. Daquele lugar transcendente, sinal da omnisciência e da omnipotência divina, Deus pode perscrutar e examinar cada pessoa, distinguindo o bem do mal e condenando com vigor a injustiça (cf. vv. 4-5).
É muito sugestiva e confortadora a imagem dos olhos divinos, cujas pupilas contemplam e observam as nossas acções. O Senhor não é um remoto soberano, fechado no seu mundo dourado, mas uma Presença vigilante que se declara da parte do bem e da justiça. Ele vê e providencia, intervindo com a sua palavra e com a sua acção.
O justo prevê que, como acontecera em Sodoma (cf. Gn 19, 24), o Senhor "fará chover sobre os ímpios carvões acesos e enxofre" (Sl 10, 6), símbolos do juízo de Deus que purifica a história, condenando o mal. O ímpio, atingido por esta chuva ardente, que prefigura o seu destino último, experimenta fielmente que "há um Deus que faz justiça sobre a terra" (Sl 57, 12).
4. Contudo, o Salmo não se conclui com este quadro trágico de punição e de condenação. O último versículo abre o horizonte para a luz e para a paz que se destinam ao justo que contempla o seu Senhor, juiz justo, mas sobretudo libertador misericordioso:  "os homens honestos contemplarão a sua face" (Sl 10, 7). Trata-se de uma experiência alegre de comunhão e de confiança serena no Deus que liberta do mal.
Fizeram uma experiência como esta os numerosos justos ao longo da história. Muitas narrações descrevem a confiança dos mártires cristãos face às atrocidades e a sua determinação que não evitava a prova.

Nos Actos de Euplo, diácono de Catânia, falecido por volta de 304 sob Diocleciano, o mártir exclama espontaneamente esta sequência de orações:  "Obrigado, ó Cristo:  protege-me porque sofro por ti... Adoro o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Adoro a Santíssima Trindade... Obrigado, ó Cristo. Vem em meu auxílio, ó Cristo! Sofro por ti, ó Cristo... É grande a tua glória, ó Senhor, nos servos que te dignaste chamar a ti!... A ti dou graças, Senhor Jesus Cristo, porque a tua força me confortou; não consentiste que a minha alma perecesse com os ímpios e concedeste-me a graça do teu nome. Agora confirma o que fizeste em mim, para que seja confundida a impudência do Adversário" (A. Hamman, Orações dos primeiros cristãos, Milão 1995, págs. 72-73).

PAPA JOÃO PAULO II
AUDIÊNCIA GERAL

Quarta-Feira, 28 de Janeiro de 2004



Diretório Franciscano - Salmo 10 (Espanhol)


Comentário de Santo Agostinho:

1 - "Para o fim. Salmo do mesmo Davi". O título não carece de nova explicação. Já foi suficientemente explanado o que significa: "Para o fim". Vejamos, pois, o próprio texto do salmo que, a meu ver, é cantado contra os hereges, os quais rememorando e exagerando os pecados de muitos na Igreja, como se fossem justos todos eles, ou ao menos a maioria, esforçam-se por nos afastar e arrebatar do seio da verdadeira mãe, a única Igreja. Afirmam estar Cristo no meio deles e nos exortam, como se estivessem movidos de piedade e zelo, a passarmos, aderindo a eles, para junto de Cristo, que mentem ter consigo. É sabido que Cristo nas profecias, onde muitos nomes lhe são atribuídos alegoricamente, é também denominado monte. Respondamos-lhes, portanto: "No Senhor eu confio. Por que dizer a minha alma: Foge para os montes como o pássaro?" Tenho um só monte de minha confiança. Como, então. dizeis que passe para o vosso lado, como se existissem muitos Cristos? Ou se sois montes por causa da soberba, devo ser pássaro, tendo por asas as virtudes e preceitos de Deus. Mas, são eles mesmos que me proíbem voar em direção àqueles montes e pôr a esperança nos soberbos. Tenho casa onde descansar, porque confio no Senhor; pois também o pássaro encontrou uma casa (Sl 83,4). E o Senhor se fez o refúgio do pobre (Sl 9,10). Digamos, portanto, com toda a confiança, para não perdermos a Cristo, procurando-o entre os hereges: "No Senhor eu confio. Porque dizeis a minha alma: Foge para os montes como o pássaro?"
2 - "Eis que os pecadores retesaram o arco, dispuseram na aljava as suas setas, para alvejarem, sob uma lua obscura, os retos de coração". Terrores iminentes, provindos dos pecadores, a fim de passarmos para o seu lado, como se eles fossem justos. "Eis que os pecadores armaram o arco". Creio nas Escrituras, de onde eles extraem sentenças envenenadas, interpretando-as carnalmente. "Dispuseram na aljava as suas setas". Prepararam ocultamente no coração as palavras que vão arremessar apoiados na autoridade das Escrituras. "Para alvejarem sob uma lua obscura, os retos de coração". Ao perceberem que não poderão ser convencidos de erro, uma vez que se obscureceu a luz da Igreja, por causa da multidão de homens ignorantes e carnais, procuram corromper por meio de más palavras os bons costumes (1Cor 15,33). Contra esses terrores, digamos: "No Senhor eu confio".











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